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segunda-feira, 24 de novembro de 2008

AUTO-DE-FÉ DE BARCELONA

Auto-de-fé de Barcelona é uma expressão notabilizada por Allan Kardec para se referir à queima, em praça pública, de trezentos livros espíritas, realizada no dia 9 de outubro de 1861 em Barcelona, Espanha. Foi utilizada pela primeira vez no subtítulo do artigo "O resto da Idade Média", publicado em novembro daquele ano, na "Revue Spirite".
História
Maurice Lachâtre, editor francês, achava-se estabelecido em Barcelona com uma livraria, quando solicitou a Kardec, seu compatriota, em Paris, uma partida de livros espíritas, para vendê-los na Espanha.
Quando os livros chegaram ao país, foram apreendidos na alfândega, por ordem do Bispo de Sevilha, sob a alegação de que "A Igreja católica é universal, e os livros, sendo contrários à fé católica, o governo não pode consentir que eles vão perverter a moral e a religião de outros países". O mesmo eclesiástico recusou-se a reexportar as obras apreendidas, condenando-as à destruição pelo fogo.
O auto-de-fé ocorreu na esplanada de Barcelona, às 10h30 da manhã. Conforme lista oficial transcrita na "Revue Spirite", foram queimados os seguintes títulos:
Revista Espírita, dirigida por Allan Kardec;
A Revista Espiritualista, dirigida por Piérard;
O Livro dos Espíritos, por Allan Kardec;
O Livro dos Médiuns, por Allan Kardec;
O que é o Espiritismo?, por Allan Kardec;
Fragmento de sonata, atribuído ao Espírito de Mozart;
Carta de um católico sobre o Espiritismo, pelo doutor Grand;
A História de Jeanne d'Arc, atribuído a Joana D'arc pela médium Ermance Dufaux;
A realidade dos Espíritos demonstrada pela escrita direta, pelo barão de Guldenstubbé.
A mesma fonte informa terem assistido ao evento:
um padre, com as roupas sacerdotais, trazendo a cruz numa mão e a tocha na outra;
um notário encarregado de redigir a ata do auto-de-fé;
o escrevente do notário;
um funcionário superior da administração da alfândega;
três serventes da alfândega, encarregados de manter o fogo;
um agente da alfândega representando o proprietário das obras condenadas pelo bispo; e
uma multidão, que vaiava o religioso e seus auxiliares aos gritos de "Abaixo a inquisição!"
O evento causou viva impressão através da imprensa de todo o mundo à época, evocando as antigas fogueiras do Santo Ofício, chamando a atenção para as obras espíritas.

Necrologia
Revista Espírita, agosto de 1862
A morte do bispo de Barcelona

Escreveram-nos da Espanha que o bispo de Barcelona, aquele que fez queimar trezentos
volumes espíritas, pelas mãos do carrasco, a 9 de outubro de 1861 (1-(1) Ver, para os
detalhes, a Revista Espírita dos meses de novembro e dezembro de 1861), morreu no dia 9
deste mês, e foi enterrado com a pompa habitual para os chefes da Igreja. Nove meses
somente se escoaram desde então, e já aquele auto-de-fé produziu os resultados
pressentidos por todo o mundo, quer dizer, apressou a propagação do Espiritismo naquele
país. Com efeito, a repercussão que esse ato inqualificável teve neste século, chamou sobre
a Doutrina a atenção de uma multidão de pessoas que jamais dela ouviram falar, e a
imprensa, não importa qual opinião, não pôde ficar muda. A disposição deplorável, nessa
circunstância, era sobretudo de atiçar a curiosidade pelo atrativo do fruto proibido, e
sobretudo pela própria importância que isso dava à coisa, cada um dizendo-se que não se
procede desse modo por uma bagatela ou um sonho vazio; muito naturalmente o
pensamento se transportou a alguns séculos atrás, dizendo-se que recentemente, nesse
mesmo país, não se queimou somente os livros, mas as pessoas. Que poderiam, pois,
conter os livros dignos das solenidades da fogueira? Foi o que se quis saber, e o resultado
foi na Espanha o que é por toda a parte onde o Espiritismo foi atacado; sem os ataques
zombeteiros ou sérios dos quais foi objeto, contaria dez vezes menos partidários do que os
tem; quanto mais a crítica foi violenta e repetida, mais foi posto em relevo e fez crescer; os
ataques calmos podem passar despercebidos, ao passo que os relâmpagos de raio
despertam os mais entorpecidos; se quer ver o que se passa, e é tudo o que nós pedimos,
seguros antecipadamente do resultado do exame. Este é um fato positivo, porque cada vez
que, numa localidade, o anátema desceu sobre ele do alto da cátedra, estamos certos de
ver o número de nossos assinantes crescer, de vê-los chegar, se não os havia antes. A
Espanha não podia escapar a esta conseqüência, também não há um Espírita que não se
rejubilou tomando o auto-de-fé de Barcelona, pouco depois seguindo o de Alicante, e
mesmo mais de um adversário deplorou um ato em que a religião nada tinha a ganhar.
Cada dia temos a prova irrecusável da marcha progressiva do Espiritismo nas classes mais
esclarecidas daquele país, onde conta zelosos e fervorosos adeptos.
Um de nossos correspondentes da Espanha, nos anunciando a morte do bispo de Barcelona,
convidou-nos a evocá-lo. Dispusemo-nos a fazê-lo, e havíamos, em conseqüência,
preparado algumas perguntas, quando ele se manifestou espontaneamente por um de
nossos médiuns, respondendo antecipadamente a todas as perguntas que queríamos dirigir-lhe,
e antes que elas tivessem sido pronunciadas. Sua comunicação, de um caráter
inteiramente inesperado, contém entre outras a passagem seguinte:
"................................................................................ Ajudado por vosso chefe
espiritual, pude vir vos ensinar pelo meu exemplo e vos dizer: Não repilais nenhuma das
idéias anunciadas, porque um dia, um dia que durará e pesará como um século, essas
idéias anunciadas gritarão como a voz do anjo: Caim, que fizeste de teu irmão? Que fizeste
de nosso poder, que devia consolar e elevar a Humanidade? O homem que,
voluntariamente, vive cego e surdo de espírito, como outros o são de corpo, sofrerá,
expiará e renascerá para recomeçar o trabalho intelectual que sua preguiça e seu orgulho
lhe fizeram evitar; e essa terrível voz me disse: Queimaste as idéias, e as idéias te
queimaram.......................
"Orai por mim; orai, porque ela é agradável a Deus, a prece que lhe dirige o perseguido
pelo perseguidor.
"Aquele que foi bispo e que não é mais que um penitente."
O contraste entre as palavras do Espírito e as do homem nada tem que deva surpreender;
todos os dias se vê quem pensa de outro modo depois da morte que durante a vida, uma
vez que a venda das ilusões caiu, e é uma incontestável prova de superioridade; os
Espíritos inferiores e vulgares persistem nos erros e preconceitos da vida terrestre. Quando
vivo, o bispo de Barcelona via o Espiritismo através de um prisma particular que lhe
desnaturava as cores, ou, dizendo melhor, não o conhecia. Agora ele o vê sob sua
verdadeira luz, e sonda-lhe as profundezas; tendo caído o véu, isso não é para ele uma
simples opinião, uma teoria efêmera que se pode abafar sob a cinza: é um fato; é a
revelação de uma lei da Natureza, lei irresistível como a força da gravidade, lei que deve,
pela força das coisas, ser aceita por todos, como tudo o que é natural. Eis o que ele
compreende agora, e o que lhe fez dizer que: "as idéias que quis queimar o queimaram,"
dito de outro modo, carregaram os preconceitos que lhe havia feito condenar.
Não podemos, pois, isso admitir, pelo tríplice motivo de que o verdadeiro Espírita não quer
isso para ninguém, não conserva rancor, esquece as ofensas e, a exemplo do Cristo, perdoa
aos seus inimigos; em segundo lugar porque, longe de nos prejudicar, nos serviu; enfim,
que reclama de nós a prece do perseguido pelo perseguidor, como a mais agradável a
Deus, pensamento todo de caridade, digno da humildade cristã que revelam estas últimas
palavras: "Aquele que foi bispo e que não é mais que um penitente." Bela imagem das
dignidades terrestres deixadas à beira do túmulo, para se apresentar a Deus tal qual é, sem
a aceitação que dela impunha aos homens.
Espíritas, perdoai-lhe o mal que quis nos fazer, como gostaríamos que nossas ofensas nos
fossem perdoadas, e oremos por ele no aniversário do auto-de-fé a 9 de outubro de 1861.

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